terça-feira, abril 14, 2009

Eu não sei

Eu não sei dançar. Não sei dirigir. Não sei cozinhar. Não sei jogar bola. Não sei jogar vôlei, nem basquete, nem golfe, nem rugby, nem tênis, nem peteca. Não sei empinar pipa.

Eu não sei falar inglês. Não sei falar francês. Italiano. Espanhol. Alemão. Japonês, javanês, dialeto, mandarim, húngaro, não sei latim nem grego.

Eu não sei assoviar no ritmo, não sei estalar os dedos, não sei falar nenhum dos trava-línguas. Não sei ver as horas em relógio de ponteiro, não sei de cor a tabuada do nove, não sei qual é a capital da Nova Zelândia, nem sei direito onde fica a Nova Zelândia. Não sei dizer se uma palavra é paroxítona, não sei ler partitura, não sei onde fica a bridge na letra da canção. Eu não sei tocar violão. Não sei tocar piano, não sei tocar flauta, nem bongô, nem cuíca, nem tamborim, nem pandeiro, nem chocalho, nem frigideira, nem instrumento nenhum do mundo, instrumento daqui, de Marte ou da estrela Órion, não sei tocar porra nenhuma.

Eu não sei quem foi Molière, nem Voltaire, nem Joyce, nem João Antônio. Eu não sei quem foi São Tomás de Aquino.

Eu não sei cavalgar. Não sei nome de raça de cachorro, muito menos de gato. Não sei quantas patas tem um escorpião, não sei se a gente diz pata ou perna pra inseto, não sei de que se alimenta uma anta.

Eu não sei pescar, não sei jogar truco, não sei mentir.

Eu não sei contar piada direito, não sei memorizar citação de autor famoso, não sei com quantos paus se faz uma canoa. Não sei com quantas canoas se faz uma nau, não sei porque o barco do Colombo se chamava Santa Maria. Não sei porque a loja de ternos se chama Colombo, mas isso nem quero saber.

Eu não sei costurar, não sei rezar, não sei atirar com espingarda, nem com carabina, nem com revólver, nem com pistola, nem com estilingue, nem com arco-e-flecha, nem com arma de chumbinho.

Eu não sei como se faz pra tirar passaporte, pra abrir firma de empresa, pra conseguir visto de trabalho no estrangeiro, licença pra abrir loja no centro, carta de crédito, antecedentes criminais.

Eu não sei nada de hardware, software ou surfwear. Não sei andar de skate, não sei enrolar baseado, não sei fazer serviços de carpintaria. Eu não sei trocar disjuntor, consertar liquidificador, cano furado, válvula de descarga bichada, arruela emperrada.

Eu não sei seduzir, conquistar, convencer, xavecar, pechinchar, negociar, persuadir, embromar, enrolar, ganhar tempo, cozinhar em banho-maria, deixar de molho, passar a perna, até logo, pt saudações, como diria meu pai.

Eu não sei fazer balancete, planilha, contas a pagar e a receber, tratar com fornecedor.

Não sei pedir dinheiro na rua, roubar dinheiro na rua, roubar dinheiro no banco, no supermercado, no banco imobiliário.

Eu não sei se a mulher tá bem vestida, bem maquiada, se calça preta combina com blusa verde e sapato verde, se ela engordou, emagreceu, se o mundo é mau ou bom.

Não sei ser garanhão na cama, nem recitar poema do Drummond depois, nem música do Djavan. Não sei o que diabos o Djavan quer dizer, afinal.

Eu não sei (mais) andar de bicicleta, criar estorinhas, caçar tatu-bolinha, fazer dobradura com papel sulfite.

Não sei amar. Não sei odiar também, mas isso nem importa. Eu não sei amar.

Eu sei escrever, apenas. Malemale.

1 Comments:

Blogger Liliane Akamine said...

"Eu não sei viver triste e sozinho, é a minha condição..."
Espero que este seja um texto fictício, afinal algumas dessas coisas eu já vi você fazendo muito bem. Principalmente escrever. Ás vezes meio Thom Yorke mas tudo bem, adoro Radiohead e nunca cortei os pulsos ouvindo.
Beijo querido!

abril 15, 2009 6:26 AM  

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