sábado, novembro 29, 2008

Não gosto de sol

AUSÊNCIA
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços, que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade
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Não acho mais bonito fazer poesia da dor. Só que, tal como num piano de uma tecla só, meus sentimentos se oferecem numa única nota, que fica soando no oco da minha cabeça, não importa quantas melodias eu jogue por cima pra cobrir tudo. Me exaspero com essa sensação medonha, mas é um labirinto do qual não consigo sair. Estou pagando o preço de ser quem eu sou. E quanto mais reclamo, mais dobrado pago.
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Eu não gosto do sol. Não gosto da luz do sol. Não gosto do calor do sol. Não gosto de ler coisas como "você é meu raio de sol". Só quem deveria gostar do sol são os seres que fazem fotossíntese. Nós, humanos, deveríamos encarar o sol como um mal necessário.
A noite sim é bonita. As luzes da noite, as caras da noite. O silêncio da noite e até o barulho da noite. A noite traz no silêncio da lua uma discreta cumplicidade para minha alma atormentada, enquanto no sol eu sinto sempre um escárnio, um descaso, um tapa na cara na manhã de cada dia. A noite é curta e deixa saudade, enquanto o tempo que passamos debaixo do sol é infindável. É uma visita inconveniente que não sabe a hora de ir embora. Se eu pudesse, eu desligava o interruptor do sol e viveria sempre na noite, cortinas fechadas. Vibro quando nuvens pesadas tapam o sol. Eu quero que chova, quero que o sol se foda.
Quando criança, eu desenhava o sol sempre sorrindo. Hoje eu sei por quê: o sol sorri mesmo. Escarnece da gente. Porque o homem pisou na lua (é o que dizem...). Mas nunca vai pisar no sol.