sexta-feira, janeiro 27, 2006

São Paulo, Meu Lar, Minha Vida

Tecnicamente eu não sou um paulistano. Nasci no município de Guarulhos. Aliás, isso é uma crise de identidade fudida na minha vida. Porque apenas NASCI em Guarulhos. Assim que o médico assinou a alta hospitalar, eu já vim para a cidade na qual passaria minha infância e, provavelmente, toda a minha vida. Então me considero um paulistano, embora minha certidão de nascimento diga que sou um guarulhense. Meus pais nasceram e se criaram na Zona Norte de São Paulo. Os pais de meu pai (Nicolau e Pura) também nasceram na cidade, filhos da colônia espanhola que residia pros lados do Bom Retiro, Pari e adjascências. Minha avó materna, Dna. Itália, a mulher que me criou (e que me cria até hoje) é francana de nascimento, mas passou a infância e adolescência no Triângulo Mineiro. Veio pra cá com meu avô, Fábio, que era mineiro também mas morreu aqui, nalguma esquina do Jaçanã, de traumatismo craniano. Como se vê, minha família tem raízes recém-nascidas em São Paulo.

São Paulo é uma cidade fascinante, a meu ver, porque sempre há algo novo pra se descobrir. Por mais que você ande por aí, sempre haverá uma esquina que você nunca dobrou ou uma ponte que nunca atravessou. Os mendigos nas ruas mudam de tempos em tempos. A sujeira, a poeira, tudo é de cárater cíclico e transitório. Cada assalto sofrido é uma emoção nova. Afinal, um ladrão não pode levar duas vezes o mesmo relógio.

Sou apaixonado pela Zona Norte. Aqui estão construções famosas. O Carandiru, implodido recentemente era uma atração pra quem passava de metrô, como dizem os Racionais naquela música. Muitos pagodeiros, que fizeram sucesso na década de 90 tinham seus barzinhos em Santana, Tucuruvi e seus casarões ali na Serra da Cantareira. Vez por outra você podia emparelhar seu humilde Fiat Uno com a BMW de algum deles num sinal de trânsito no Jardim Tremembé e receber um sorriso travesso da negritude, só pra contrariar. Dizem que eles - a maioria, pelo menos, salvos os que viraram cantores latinos de música brega - cheiraram as BMWs todas. Há ainda o simpático bairro do Jaçanã, onde morei por 7 anos e onde vou sempre, porque parte da minha família reside lá. Sinto um certo orgulho por, de certa forma, pertencer ao bairro da canção do Adoniran. Tucuruvi e seus sebos é um bairro especial também e que cresceu muito, principalmente depois que ganhou estação de metrô. Santana é o local para onde preciso rumar sempre que tenho que ir pra algum lugar. É onde, pode-se dizer, começa a "civilização".

E chegamos finalmente à Pedra Branca, o bairro onde vivo desde os 7 anos de idade. De um lado, o Horto Florestal. De outro, a Serra da Cantareira. E os bairros vizinhos, que são apenas extensões da PB - com um pouco mais de comércio e movimento, é verdade. Nos últimos anos, botaram um Corpo de Bombeiros na saída do bairro e um posto policial no centro dele. A construção mais imponente dessa cercania aprazível e pacata é um conjunto habitacional da Inocoop conhecido na região como "os predinhos". Trata-se de um grande buraco construído ao lado da estrada que leva a Mairiporã. Nesse buraco fincaram 10 blocos de apartamentos com algumas guaritas em volta, um pouco de mato em locais estratégicos, vagas para carros por toda parte e um playground ao centro. Muita escada pra se subir, o playground imundo e pessoas com o rei na barriga. Cresci ali, rodando todo o espaço murado, convivendo com seguranças e rumores de que crianças da favela vizinha queriam e podiam pular os muros. Conheci as injustiças sociais aos poucos e vi o que era a classe média falida. Pessoas que não pagam o condomínio pra trocar de carro todo ano. Crianças desrespeitando faxineiras e demais funcionários que estão sempre por aí tentando deixar as coisas em ordem, embora os garotos sempre urinassem nos elevadores (problema só sanado quando botaram câmeras em toda a parte), quebrassem fechaduras, sujassem paredes e promovessem balbúrdias.
Quem não sabe como é a merda por dentro inveja o local. O condomínio goza de enorme popularidade no bairro. Quem já morou aqui volta sempre. Quem não mora, dá um jeito de entrar, como se aqui fosse um paraíso. Eu invejo, por outro lado, essas pessoas que moram em casinhas humildes, sem status, mas pelo menos não tem que conviver com gente arrogante que come mosca e arrota frango assado. Classe média falida que não tem culhão pra comprar um apê na Voluntários da Pátria. Quando cresci, comecei a fazer amigos fora do buraco negro. O bairro é bom, contudo. As pessoas são pobres, porém limpinhas, como já diria aquele esquete de humor da Globo. Exceto no condomínio, é evidente.
Ralei meus joelhos no Horto tentando pular poças de água. Cantei no coral, abracei árvores, recolhi lixo que jogavam no meio-ambiente. Me matei em corridas, bebi água da bica, fiz pique-niques em épocas remotas. Pensei muito na vida. Vi os velhos correndo por ali e tentei dar saltos mentais no tempo. Chorei, humilhado por uma professora de educação física e suas corridas de revezamento. Fui um "Amigo do Horto".

Celebrei os primeiros amores. Ou pré-amores, uma vez que não sabia amar ainda. Construí lembranças. Assisti jogo na TV da padaria.

Me apaixonei (ou algo que o valha) por uma menina da Vila Mazzei.

Conheci bem também outros bairros, como Ipiranga, Vila Mariana, Brás, Paulista e centrão velho. Enfim, muita coisa pra falar e lembrar.

Eu amo São Paulo? Creio que amo. Mesmo descobrindo essa gente xenófoba, bairrista, burguesa, assassina de mendigos. Gente que bate palmas pra Geraldo Alckmin e que diz, o peito estufado: "a Locomotiva do País". Blargh... Essa classe média falida que domina tudo e controla o mundo de dentro de shoppings centers, com seus celulares pré-pagos. E a cidade segue com os favelados e nordestinos que eles tanto odeiam. E na Zachi Nachi aquele Cingapura que não engana ninguém. E temos ainda os malufistas.

Parabéns São Paulo, 452 anos. Um dia serei digno de escrever sobre ti.

4 Comments:

Blogger Gabriela said...

Parabéns SP... Obg por fazer parte de qm eu sou... Msm com ais e tais...
E, aih, rolou o filme? Espero q sim! Hj tem odisseia, mas jah eh paga... Se houver interesse, dah um pulo q vou estar por lah...
Bjss

janeiro 27, 2006 8:09 AM  
Blogger A. Diniz said...

São Paulo é uma cidade fascinante. E fascista. Pena que a TV Cultura achincalhe tão bela cidade com um "burguesismo" tão intransigente. Mais comentários, procure a Bunda no meu blog. A Bunda é o caminho.

janeiro 27, 2006 11:28 AM  
Blogger A. Diniz said...

São Paulo é uma cidade fascinante. E fascista. Pena que a TV Cultura achincalhe tão bela cidade com um "burguesismo" tão intransigente. Mais comentários, procure a Bunda no meu blog. A Bunda é o caminho.

janeiro 27, 2006 11:28 AM  
Anonymous Anônimo said...

o que eu estava procurando, obrigado

novembro 19, 2009 11:03 PM  

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