quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Como agir numa situação-limite (Parte 1 de 2000)

Uma historinha que meu pai me contou hoje:

Um conhecido do meu velho, chamado Pedrão*, foi passar uns dias na praia com a família e um grupo de amigos e famílias de amigos. Pois bem, estavam todos lá naquele clima de confraternização quando Pedrão saiu pra dar uma volta de bicicleta. Quando retornou, notou que a fechadura do portão estava trancada de maneira diferente da que ele tinha deixado. Já cabreiro, notou que havia movimentação estranha na casa, mas pensou consigo mesmo que deviam estar recebendo algum conhecido lá dentro. Mesmo assim o Pedrão, um cara grande (como o próprio nome parece indicar) entrou ressabiado na casa e foi direto para a cozinha, onde se encontravam as pessoas. Lá chegando deu de cara com um desconhecido, a quem foi cumprimentar. Nisso viu que o sujeito tinha uma das mãos enfiadas dentro da camisa. Antes que Pedrão pudesse indagar qualquer coisa, foi informado de que "aquilo se tratava de um assalto". E notou a presença de outros dois elementos, um deles mantendo uma arma colada ao crânio de uma criança da casa.

Bom, até aqui já temos uma situação que, não fosse banal nos dias atuais, poderia chocar algumas pessoas. Mas o que me chocou de verdade vem mais adiante. Não se sabe bem como, um dos hóspedes da casa, num momento de distração do bandido que mantinha a criança na mira, conseguiu travar a arma e desarmar o bandido. "Ótimo!", pensarão os leitores. Uma história com final feliz. O menino não morreu, eles chamaram a polícia e tudo terminou bem.

É, foi o que pensei também antes de que meu pai me contasse o fim da história. Mas o que ocorreu foi que, após desarmar o ladrão, os homens daquela casa o cercaram e o COBRIRAM DE PORRADA. Mas não qualquer porradinha que qualquer um de nós gostaria de dar num covarde que bota um revólver na cabeça de uma criança de 3 anos. Não! Os caras bateram na cabeça do bandido com uma pedra que havia no jardim. Os dois comparsas saíram num pinote enquanto isso e só foram pegos pela polícia um tempo depois - e logo mais digo o que aconteceu com eles. Daí ainda com muita fúria, furaram o ladrão com faca. Murros, socos, pauladas, pedradas, barulho de ossos se partindo, enfim, uma barbárie completa.
O assaltante chegou morto ao hospital. (A enfermeira percebeu que se tratara de assassinato, não obstante a versão dada a ela de que o cara tinha "caído numa lança"). Seus dois comparsas, pegos pela polícia em Bertioga - um tempo depois - com celulares, relógios e outros objetos, tiveram o mesmo fim: foram roubar São Pedro. Importante ressaltar que, entre os amigos do Pedrão, havia um inspetor de polícia. Que deve ter providenciado pessoalmente a captura dos comparsas do ladrão morto.


Qual seria a moral da história? Isso é uma coisa polêmica. Meu pai definiu a situação como "um estado de ódio e pânico no qual todos estamos vivendo". Muitas pessoas - algumas que até conheço e a quem respeito - dirão que Pedrão e seus amigos agiram de forma correta, que bandido bom é bandido morto (digite isso no buscador de comunidades do Orkut e veja quantas aparecem). Eu, porém, coloco algumas questões:

- Pedrão é um civil. Se tivesse agido nesse assalto como orientam as autoridades e peritos na tevê ("nunca reaja a um assalto, mantenha a calma, negocie com o bandido, etc"), talvez tivesse perdido a tevê, um relógio, a carteira, um bem material qualquer. Porém, com a decisão que tomou (não sozinho, evidentemente), Pedrão perdeu uma coisa que nenhum dinheiro do mundo pode comprar: a tranquilidade da própria consciência. Meu pai comentou que o cara virou um farrapo humano depois desse episódio. Talvez o plano original não fosse matar o cara. Talvez ele quisesse, como disse meu pai "dar uma surrinha pra deixar o cara esperto, quebrar uma ou as duas pernas, coisas assim". Mas a coisa desandou, como geralmente desanda quando o homem se deixar agir de forma cega pelo ódio, ou como diria Bob Jefferson, de acordo com seus "instintos mais primitivos".

- Fico imaginando o trauma de uma criança que teve um cano de revólver colado à sua testa. (Eu mesmo só vi uma arma de verdade de perto depois de adulto). Mas presenciar um espancamento, ainda que não se tenha muito apreço e consideração pelo espancado, não deve ser construtivo pra ninguém, muito menos para quem está começando a vida.

- Ser policial deve tornar um homem muito mais MACHO que os demais. Eles se sentem assim, pelo menos. Havia entre eles, como eu disse, um homem de polícia (para total azar dos bandidos, que escolheram a hora e o local errado para entrarem em ação). E este "policial" deveria fazer cumprir a Lei. Bom, ele fez com que a Lei fosse cumprida. Mas não a Lei que está escrita. E sim a Lei da bárbarie, que a polícia de Diadema usa. A lei do Rambo. A Lei do policial que mata um dentista na rua porque o cara era negro e "parecia suspeito". A Lei que diz que todo bandido é bandido porque quer e por isso tem que levar bala no coco mesmo. A Lei que acha que essa turminha dos "direitos humanos" é uma cambada de desocupado que devia ter a filha estuprada por um marginal pra saber o que é bom pra tosse. A Lei de uma classe média que nunca soube o que é merda contendo ascaris lumbricoides.

Não estou defendendo bandido. O que estou defendendo vai na esteira de ideais que defendi no meu blog antigo quando da polêmica acerca do desarmamento. Antigamente decapitavam-se ou enforcavam-se pessoas nas ruas só porque elas pensavam que a Terra girava em torno do sol (e depois descobriu-se que era verdade, mas aí já era tarde para se retratar com os "bruxos" finados). Duelava-se, empalava-se, giravam corpos de pessoas em rodas de suplício, cruficava-se, queimava-se vivos, amarravam pessoas nas patas de cavalos para serem arrastadas por vilarejos inteiros, enfim, coisas desse tipo. Aí a galera estraga-prazeres dos "direitos humanos" começou a se manifestar mais e as coisas, com o passar dos séculos e evolução da raça humana, foram melhorando. Isso até a gente saber de casos como esse que contei aqui.

Eu só me perguntei uma coisa, depois que meu pai, também chocado, me contou essa história: porque não ligaram pra polícia e prenderam o cara depois que desarmaram ele? Havia necessidade daquilo? Imagino que o Pedrão esteja pensando que não. Mas agora é tarde.


*nome fictício.

2 Comments:

Blogger Gabriela said...

O homem é o lobo do homem... Seja lah o q isso quer dizer...

fevereiro 01, 2006 7:59 AM  
Blogger Pedro Henrique said...

E não sou eu!!! rs

fevereiro 05, 2006 10:01 PM  

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